quinta-feira, 6 de agosto de 2009


OS 4 MACACOS
Jorge Linhaça

Nos plúmbeos tempos da Ditadura Militar, era bastante comum vermos sobre as cômodas ou penteadeiras um conjunto de três macacos. Um tampando os olhos, outro tampando os olhos e outro a tapar os ouvidos.

Não sei se aquilo era uma forma de protesto contra o regime implantado ou um sonoro lembrete sobre o perigo de ver, ouvir ou comentar o que ocorria em nosso país.

Esses bibelôs ( assim como esta palavra ) foram caindo em desuso assim como o pinguim de geladeira, a boneca dorminhoca e as colchas de chenil.
Talvez a abertura política e o inconsciente coletivo tenham contribuído para isso.

No entanto, é inegável que esses simpáticos símios fizeram escola entre todas as classes do nosso país.

Parece-me que a sua simbologia ficou tão arraigada nas gerações da época que acabou por ser transmitida até os dias atuais.

Nem vou aqui comentar sobre as muitas comunidades dominadas pelo crime organizado onde os macacos são lei.

Vou me ater a comentar sobre o comportamento das pessoas em geral, independente de sua classe social.

Não é preciso muito esforço para perceber-se que as pessoas , em sua grande maioria, preferem não se pronunciar com respeito a coisas polêmicas ou mesmo sobre algo que possa afetar a sua popularidade seja em que esfera for.

A maioria também prefere fingir que nada vê sobre os descalabros praticados por políticos, empresários ou mesmo sobre os famosos endeusados pela mídia.

Fecham também os ouvidos a tudo que possa parecer contestatório, geralmente com a desculpa de que não entendem o suficiente sobre determinado assunto para que possam manifestar-se.

Temos portanto, cada vez mais, criado uma geração de cegos, surdos e mudos, incapazes de desenvolver o próprio senso crítico. Alguns alegam que isso se deve em boa parte aos bancos escolares, o que não deixa de ser uma verdade até certo ponto, no entanto, a escola é um microcosmo que , via de regra, reproduz aquilo que ocorre no seu entorno.

Embora ,aqui e acolá, alguma voz se levante contra a unanimidade burra, a mais pura realidade é que somos ensinados desde pequenos a "engolir sapos" para não sofrermos prejuízos profissionais, financeiros ou sociais.

A situação encontrada no senado federal, assim como tantos outros escândalos políticos, só torna-se possível por que vivemos em uma sociedade anestesiada, incapaz de uma mobilização real contra esses desmandos e falcatruas.

Desde há muito tempo que o cheiro emanado do senado e da câmara, sem contar as outras instituições políticas, é um odor putrefato como uma caixa de esgoto a céu aberto.
Esperar que a solução venha dos pares dos que cometem "atos secretos"; corrupção ou compra de votos é como acreditar que as raposas são capazes de proteger algum galinheiro.

Poderíamos perguntar onde estão os "cara pintadas" que saíram às ruas exigindo a saída de Fernando Collor de Mello da presidência da república.
Arrisco-me a responder que eles cresceram e se acomodaram ao movimento da sociedade.

Novos "caras pintadas" ? Talvez isso seja esperar demais de uma juventude, em sua maioria apolítica e preocupada demais com suas próprias tribos para dar atenção a problemas que envolvem a sociedade como um todo.

Hoje, se fossemos resgatar os simpáticos macaquinhos, teríamos de agregar a eles um quarto elemento, um novo símio a tampar o nariz, o "não cheira". Talvez estejamos já tão acostumados a sentir o odor de "algo de podre no reino da Dinamarca" que nosso olfato já não seja capaz de sentir-se agredido pelo mau cheiro exalado.

Infelizmente isto não se restringe apenas aos problemas nacionais, esse comportamento ocorre mesmo entre as relações pessoais e profissionais.

Se o favorecimento de parentes e amigos no Senado Federal, por exemplo, nos causa uma certa indignação, seria interessante analisarmos que coisas muito mais simples e corriqueiras, como por exemplo, "guardar" o lugar para alguém na fila do banco ou de algum show, faz parte do mesmo processo.

Talvez esteja justamente aí o motivo de "deixarmos o barco correr" pois se nos incomoda ver alguém ser beneficiado por outra pessoa ou instituição, se formos nós ou alguém querido que receba tal benefício isso não nos parece tão injusto assim.

Não ouço; não vejo; não falo e não cheiro por que isso pode trazer à baila, conscientemente ou não, as lembranças de meu próprio comportamento mutante.

Alguém disse certa vez que " é das pequenas coisas que provém as grandes". O condicionamento social não se consegue partindo logo para as proibições ou imposições, a melhor maneira de controlar as massas é dar-lhes uma aparente sensação de liberdade ao mesmo tempo em que, através da mídia , seja esta formal ou informal, transformamos comportamentos indesejados em algo corriqueiro e até necessário para uma aceitação social.

Nunca é demais lembrar que vivemos em uma sociedade que prioriza o "ter" sobre o "ser", onde o "ficar" reflete bem a falta de compromisso com o que quer que seja.

Nossos jovens, via de regra, não tem sonhos que não sejam voltados para o consumo ou a fama fácil.
Na ausência de sonhos reais, abre-se a perspectiva de reproduzirmos, infinitamente, os pesadelos cotidianos como a violência e a dependência química.

Deixar de ser uma sociedade que perpetua o modo de ser dos quatro macacos é o desafio que se nos apresenta hoje.
Ou encontramos uma forma de reverter este quadro ou em breve, em uma estação espacial girando na órbita da terra, poderemos ver um grande luminoso com os dizeres:

"BEM-VINDO AO PLANETA DOS QUATRO MACACOS"

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