quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

A EDUCAÇÃO DA COMPREENSÃO
David Isaacs


"Reconhece os distintos fatores que influem nos sentimentos ou no comportamento de uma pessoa, e aprofunda no significado de cada fator e em sua inter-relação e adequa sua atuação à essa realidade".

Vamos considerar o tema da compreensão dentro das relações pessoais. A descrição operativa não faz referência às conseqüências de haver chegado a compreender o outro. Mas está claro que se chegar a captar os distintos fatores que influem no estado de ânimo, ou no comportamento de outra pessoa, será mais fácil ajudá-la a melhorar em um sentido muito amplo. Inclusive, nada mais que sentir-se compreendendo pode ser uma ajuda importante em algum momento.

Um motivo para desenvolver a virtude da compreensão será, então, o desejo de ajudar outras pessoas, de acordo com suas circunstâncias, considerando quais são os fatores mais decisivos em cada caso.

Cabe perguntar-se se esta é uma virtude para os filhos pequenos ou se só compensa prestar atenção quando os filhos já são maiores. Para contestar, temos que considerar o que dissemos sobre o motivo para querer compreender. O desejo de querer ajudar de acordo com as necessidades alheias não costuma surgir até o descobrimento da intimidade, ainda que possa começar desde já, de um modo mais superficial. Refiro-me a situações em que os filhos pequenos se dão conta - chegam a ser conscientes - do estado de ânimo de outra pessoa ou reconhecem, por seu comportamento, de que necessitam de algo. Por exemplo, se uma criança nota que sua mãe está muito cansada pode ser que tente não fazer barulho ou ajudar em alguma tarefa em casa. Se nota que algum irmão está triste, pode presentear ou emprestar alguma coisa sua a este irmão, com o fim de que fique contente. Mas estas atuações costumam ser reações afetivas, resultado do carinho que tem aos demais. Tenta voltar a colocar as coisas em seu lugar: conseguir que sua mãe esteja descansada ou que seu irmão, esteja contente. Isto é, "compreende" que falta algo para que as relações estejam como devem estar. Não costuma lhe preocupar as causas da situação anômala. Não costuma esforçar-se para compreender profundamente.

Nestas idades, parece razoável que a missão dos pais é: ajudar os filhos a reconhecerem as características de cada um dos membros da família; notar que há momentos oportunos e inoportunos para falar, pedir uma coisa, etc., dar-se conta dos distintos estados de ânimo dos demais e introduzir as perguntas: que haverá acontecido para que o outro atue assim?, o que ocorreu? ou, porque estará tão triste, alegre, etc.? Deste modo, o filho pequeno irá captando os distintos fatores que podem influir sobre uma pessoa, mas a compreensão, em um nível mais profundo, somente virá com o reconhecimento nele próprio de sentimentos similares aos manifestados pelos demais.

E aqui podemos estabelecer uma pergunta importante: é possível compreender o outro se o próprio jamais teve experiência do que ele está passando? Se "compreender" significa reconhecer os fatores que influem nos sentimentos ou no comportamento de uma pessoa, a contestação será afirmativa, porque basta a experiência própria e de haver encontrado outras pessoas, na mesma ou em uma situação parecida no passado. Pelo menos, pode-se chegar a compreender o suficiente para ajudar essa pessoa a superar sua dificuldade ou para ajudá-la a melhorar. De todas as formas, haveria que ter em conta o perigo que supõe transpassar os próprios sentimentos e reações a outra pessoa, simplesmente porque as suas circunstâncias parecem similares às que viveu pessoalmente. A compreensão não é só sentir com o outro. Isto é simpatia, mas também tentar ver as coisas de seu ponto de vista, ou seja, a empatia. Este grau de compreensão somente desenvolver-se-á se a pessoa capta a importância da compreensão e de sua missão de ajudar os demais.

A empatia

Para compreender bem o que queremos dizer por empatia, temos que fazer referência aos estudos de alguns psicólogos. Em 1957, Rogers falou de empatia como "perceber o marco interior de referência do outro com exatidão, e com os componentes emocionais que lhe pertencem, como se alguém fosse essa pessoa, mas sem perder a condição de observador". Entretanto, outros psicólogos que lhe seguiram, começaram a confundir esse estado de empatia com o processo. Isto é, com a manifestação da empatia. Concretamente, Traux, em 1970, opinou que empatia é "...mais que a habilidade do orientador de ser sensível ao mundo privado do cliente como se fosse seu. Também supõe mais que saber o que o cliente quer dizer. Empatia exata supõe não só sensibilidade do orientador para os sentimentos atuais do outro, mas também sua capacidade de comunicar esta compreensão em uma linguagem apta para os sentimentos do cliente". Fazemos referência a estas posturas, não para adotar uma delas a respeito de como se deve entender a empatia, mas para destacar que na virtude da compreensão nos interessam as duas capacidades. Na formação de orientadores tem havido muita discussão sobre que aspectos deste processo devem ser considerados prioritários ou, inclusive, se há outros aspectos que devem ser cuidados: "a potencialidade da pessoa, a respeito da empatia, pode ser bloqueada ou impedida por problemas pessoais, por emoções que contrastam ou pela falta de capacidade de enfocar a situação adequadamente. É mais apropriado tentar afastar estas dificuldades para a empatia, que tentar adestrar a capacidade empática".

Sem seguir com os pensamentos dos psicólogos, parece evidente que os pais, pensando na educação de seus filhos, devem preocupar-se em algum grau com cada um destes problemas. Concretamente:

- Como ajudar os filhos a estarem pessoalmente em ótimas condições para compreenderem os demais?

- Como conseguir que aprendam a ver a outra pessoa empaticamente, reconhecendo os distintos aspectos que influem em seus sentimentos e em seu comportamento?

- Como ensiná-los a comunicar sua compreensão para ajudar o outro?



Condições e circunstâncias pessoais para ser compreensivo

A observação da vida de cada dia, em relação aos demais, pode nos mostrar muitas verdades. Uma delas tem a ver com as condições que uma pessoa necessita possuir para receber alguma informação. Se se tenta comunicar uma informação quando a outra pessoa está preocupada por uma questão pessoal, o mais provável é que não escute ou que não assimile. Por exemplo, se um pai diz uma série de instruções a seu filho quando o filho acaba de ver um acidente e queria contá-lo a seus pais, é provável que seu filho não o escute. O mesmo ocorre quando se trata de compreender os demais. Isto é, se os filhos estão concentrados em seus próprios problemas, é lógico que não se abram suficientemente para preocupar-se com os demais. A lição é fácil de entender, mas não tão fácil de viver na prática.

Se quisermos que nossos filhos, estejam em condições de compreender os demais, temos que ajudá-los, em primeiro lugar, a esquecerem-se de seus próprios problemas. Mas talvez a palavra "esquecer" não seja a correta. Melhor, trata-se de reconhecer os problemas em justa realidade: importantes ou secundários, e começar a colocar os meios para superá-los. A observação mostra, outra vez, que enquanto se colocam os meios para superar um problema, a tensão interior desaparece em grande parte. Por isso, os problemas que mais podem obstaculizar a virtude da compreensão são os que parecem não ter nenhuma solução. Estes produzem um estado de ânimo no qual a pessoa continua dando voltas e voltas no mesmo tema, incapaz de ver ou de centrar-se na ajuda aos demais.

Neste sentido, veremos como o filho que aprendeu a confiar razoavelmente em suas próprias capacidades, na ajuda de seus pais e dos demais e, de um modo muito especial, em acreditar na ajuda de Deus, estará em boas condições para tentar compreender os demais.

Por outro lado, tratar-se-á de ajudar os filhos a não terem preconceitos. Falamos deste tema em outro momento, mas aqui conviria refletir sobre alguns dos problemas típicos nos filhos, neste sentido. Compreender é um ato de recolher informação sem julgar a pessoa. Portanto, se se descarta o comportamento do outro desde o princípio, dificilmente vai poder prestar a atenção adequada aos fatores que influíram nessa situação. Por exemplo, um pai de família poderia aborrecer-se com seu filho, porque este o insultou. A única coisa que percebe é que o insultou e nem sequer pretende tentar compreendê-lo e saber o porque desta atuação. O filho realmente queria insultar e aborrecer seu pai? Ou com este insulto está expressando algum tormento interior que não quer ou não é capaz de manifestar?

É a serenidade, a segurança em si mesmo, a flexibilidade, o bom humor, que permite contar com uma atitude para os demais.



Do livro "A educação das virtudes humanas e sua avaliação", de David Isaacs.

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