A perda dos rituais e a complexidade do mundo atual
exigem amadurecimento mais individualizado e problemático. Mas as dificuldades
não são apenas dos jovens. Afinal, a "aborrecência" existe ou o termo
serve para estigmatizar os adolescentes?
Segundo a Organização Mundial da Saúde, a
adolescência é um período da vida, que começa aos 10 e vai até os 19 anos, 11
meses e 29 dias, e segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente começa aos 12
e vai até os 18 anos, onde acontecem diversas mudanças físicas, psicológicas e
comportamentais. Nessa fase ocorrem pelo menos três fenômenos importantes do
desenvolvimento humano: do ponto de vista biológico, a puberdade, com o
amadurecimento sexual e reprodutor; do ponto de vista social a passagem da
infância para a vida adulta, com a assunção de papéis adultos e a autonomia em
relação aos pais; e, do ponto de vista psicológico, a estruturação de uma
identidade definitiva para a subjetividade (projeto de vida).
O final da adolescência ocorre quando o adolescente
recebe plenas prerrogativas de adulto.
A adolescência geralmente é dividida em três
períodos:
1) Pré-adolescência ou Adolescência Menor / Fase
Pré-puberal: O marco principal da pré-adolescência ou adolescência menor é
o aparecimento da puberdade. As mudanças biológicas da puberdade são iniciadas
e controladas por interações complexas de sistemas gonadal e adrenal e pelo
eixo hipotalâmico-hipofisário.
A atividade dos hormônios produz as manifestações
clínicas da puberdade, tradicionalmente categorizadas como características
sexuais primárias e secundárias.
As características primárias são aquelas
diretamente envolvidas no coito e na reprodução: órgãos reprodutores e
genitália externa. As características secundárias incluem o desenvolvimento dos
seios, alargamento nos quadris nas mulheres, e crescimento de pêlos faciais e
mudança no tom de voz, nos homens.
As grandes transformações orgânicas impõem
dificuldades de ajustes mentais correspondentes, daí uma fase de grande
retraimento.
2) Adolescência Intermediária ou
Média / Fase Puberal / Puberdade: Dois
importantes eventos biológicos ocorrem, durante este período de transição entre
o início e final da adolescência:
Os meninos finalmente alcançam e ultrapassam a
altura e peso das meninas;
a menarca (primeira menstruação) já ocorreu na
maioria das meninas.
Consequentemente, os temas de sexualidade, imagem
corporal, gravidez, papéis estereotipados para homens e mulheres, popularidade
e identidade estão entre as múltiplas preocupações, frequentemente opressivas
aos adolescentes, durante este
estágio.
3) Adolescência tardia ou Adolescência
Maior/ Fase Pós-Puberal / Pós-puberdade: Este
período dura por cerca de três a quatro anos e termina quando o relacionamento
do adulto jovem é estabelecido. É uma fase de fortes sentimentos e emoções, com
intensos relacionamentos de oposição. Duas importantes tarefas durante este
período são:
1) Transformar-se, de uma pessoa dependente, em uma
pessoa independente e
2) Estabelecer uma identidade.
Ambas as tarefas são assumidas durante a
adolescência, mas estendem-se até a idade adulta e devem ser retrabalhadas ao
longo de todo o ciclo vital.
O conceito de "síndrome da adolescência
normal" foi criado para evidenciar exatamente este aspecto: na passagem da
infância para a vida adulta, mais do que um período de tempo, o sujeito terá de
cumprir a tarefa de viver os lutos pela perda do corpo infantil e dos pais da
infância, ressituando-se subjetivamente como adulto.
Aqui devemos ressaltar a presença da palavra
"luto", que revela a perda de algo muito valioso. Essa perda é vivida
com grande sofrimento, mas temos de criar meios de substituí-la por novas
aquisições reais, imaginárias e simbólicas.
Características comuns: ser do contra, ter manias,
comer alimentos diferentes, vestir-se de forma estranha, cultuar ídolos, passar
a gostar mais dos amigos que dos pais, conhecer novas religiões e até mesmo experimentar
variadas formas de ser.
Todas essas vivências são comportamentos que fazem
parte do processo de experimentação para encontrar a forma nova do ego. Estar
meio deprimido, chorar sem motivo aparente, ser alegre de forma exagerada,
reivindicar atitudes inesperadas dos pais são parte dessa elaboração do luto. O
processo também pode ser vivenciado com angústia, depressão e agressividade.
É importante salientar que na contemporaneidade
todas as passagens são problemáticas, pois os parâmetros históricos foram
perdidos para todas as etapas do crescimento humano, por conta da complexidade
do mundo ocidental contemporâneo. Assim, é difícil crescer, adolescer, ser
adulto, assumir a paternidade, envelhecer e morrer.
O adolescer dos pais de hoje já é antigo e o novo
adolescer lhes parece problemático, mais pela falta de identificação entre o
processo de amadurecimento das diferentes gerações que propriamente porque
estamos diante de uma "juventude perdida".
O que perdemos foram as semelhanças: outrora o
adolescer era o mesmo durante séculos, além de ser totalmente ritualizado.
Hoje, com a velocidade das mudanças, o adolescente de uma geração causa
estranhamento e perplexidade para a anterior.
Todos sofrem com isso. Os pais, principalmente,
sentem-se desorientados e vivem o luto da perda do filho dócil, companheiro - e
muito idealizado, que agora os troca pela "balada com a turma" e não
é mais o primeiro aluno da classe. Os jovens, por outro lado, ficam expostos a
um excesso de crítica, são estigmatizados e, infelizmente, muitas vezes
abandonados e incompreendidos.
O adolescer é um dos eventos cheios de emboscadas
que temos de enfrentar na vida moderna. As crises relacionadas às
transformações envolvem a todos. Pais, educadores e profissionais da saúde
também fazem parte dela e frequentemente manifestam sintomas ao enfrentar a
convivência com os jovens, revivendo suas próprias adolescências.
O desamparo e a necessidade de criar os próprios
rituais de passagem estão presentes em todos os períodos da vida humana, como
no envelhecer, no aposentar-se e até mesmo no morrer. O homem contemporâneo
está pagando, e caro, com solidão e angústia a troca dos rituais tradicionais
pela liberdade e pela individualidade.´
Cada adolescente quer revelar seu valor e sua
existência:
"SE ME AMO, EXISTO."
"PRECISO SER VISÍVEL."
"VOU MOSTRAR MEU VALOR."
"RESPEITEM MINHA OPINIÃO!"
"EU FAÇO O QUE EU QUERO!"
O adolescer implica os pais, que também vão viver
um processo de mudança de seus papéis, deixando de ser os admirados e poderosos
pais da infância, para ser apenas os pais despidos do imaginário infantil.
Nesse processo, alguns entram em pânico ao perceber que já não precisam ser tão
cuidadores e presentes como antes.
Existem situações em que o processo de amadurecimento
e busca de autonomia do adolescente é experimentado com tão grande sofrimento
pelos pais que o medo da perda dos filhos não pode ser vivido. Assim alguns
pais não conseguem mais enfrentar o desafio e as dificuldades que envolvem a
tarefa de exercer a paternidade de um adolescente.
Muitos se deprimem, se angustiam e usam o discurso
dos perigos e dos riscos para impedir que o filho cresça, mantendo-o na posição
infantil, a fim de garantir a posição de pais de uma eterna criança. É comum
esse processo de domínio sobre o filho ser perpetrado com atitudes
autoritárias, geradoras de grandes conflitos familiares.
Os educadores escolares também têm enfrentado
dificuldade de lidar com este adolescente, pois querem manter a mesma postura
do tratamento infantil. Na verdade, a forma mais provável de sucesso dentro do
espaço escolar é a de envolver, motivar e acolher este adolescente, sendo então
um referencial positivo, entre tantos negativos que o rodeiam. "Quero ser
amável como meu professor." "Como é bom assistir a aula daquele
professor que entende a gente!"
Colunista: Edileide Castro
Pedagoga, Psicanalista Clínica, Escritora,
Consultora e Palestrante.
www.edileidecastro.com
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