Não se meta na minha vida!
P. Francisco Javier Rosell Peralta
Os pais que sabem se meter na vida dos filhos conseguem fazer deles homens e mulheres de bem. Lembro-me de uma ocasião em que escutei um jovem dizendo ao seu pai:
- Não se meta na minha vida!
Esta frase calou fundo em mim, tanto que freqüentemente a recordo com relação a pais e filhos, imaginando ser eu aquele pai, e o que responderia ao meu filho.
- Filho, eu não me meto em sua vida, você é que se meteu na minha!
Faz 17 anos que, graças a Deus, pelo amor que nos unia, à sua mãe e a mim, você chegou em nossas vidas, ocupou nosso tempo durante quase três meses, sua mãe se sentindo mal, sem poder se alimentar, pois tudo o que comia lhe causava vômitos, precisando ficar de repouso; eu tive de me repartir entre as obrigações do meu trabalho e as de casa, para ajudá-la.
Já não podíamos ir a todas as reuniões, não freqüentávamos tanto os amigos, na verdade nos distanciamos de muitos deles por sua causa...
Nos últimos meses antes de você chegar, sua mãe não dormia e não me deixava dormir, eu precisava levantar cedo para ir trabalhar, no entanto tinha de me esforçar para ser paciente e ajudar sua mãe a se sentir melhor, para que você estivesse bem.
As despesas aumentaram incrivelmente, pois grande parte de nossas economias eram gastas com você: com um bom médico para cuidar de sua mãe, ajudando-a a manter uma gravidez saudável, com medicamentos, já na Maternidade, na aquisição de um guarda-roupa completo para você... sua mãe não podia ver algo de bebê que não quisesse logo para você: um berço, um cesta de alças (moisés), um carrinho de rodas, tudo o que fosse possível para você se sentir bem confortável.
Nem sequer me dei conta de ter deixado de adquirir coisas para mim, e você sabe como os aparelhos de som e os computadores me fazem delirar!
... Não se meta na minha vida?
Chegou o dia do seu nascimento, e era preciso comprar uma lembrancinha para cada pessoa que vinha conhecê-lo. Sua mãe dizia: "temos de preparar um quarto para o bebê".
Desde a primeira noite não dormimos. A cada três horas, com a estridência de um despertador, você nos acordava para que o alimentássemos, outras vezes porque se sentia mal e chorava, chorava, chorava, sem que pudéssemos ficar tranqüilos, pois nem sempre sabíamos o que se passava, e às vezes chorávamos junto com você...
... Não se meta na minha vida?
Todo tipo de doença infantil acometia você, tivemos que suspender muitas saídas nossas; sua mãe já estava toda preparada para ir a alguma reunião - depois de meses sem sair de casa -, eu, inclusive, a ponto de apressá-la, e ela me chamava para dizer: mudança de planos, nosso bebê está com febre, não podemos sair...
... Não se meta na minha vida?
Você começou a caminhar, e já nem sei desde quando tive de ficar andando atrás de você, se foi mesmo quando começou a dar os seus passinhos ou quando acreditou que já sabia fazê-lo. Eu não podia mais me sentar tranqüilamente para ler o jornal ou ver o jogo do meu time, na TV, porque era você acordar e sumia da minha vista, eu tinha que sair atrás de você para que não se machucasse.
... Não se meta na minha vida?
Entretanto recordo o seu primeiro dia de aula, quando precisei telefonar para o trabalho, dizendo que não podia comparecer, já que você, na porta da escola, não queria se soltar de mim e entrar, chorava e me pedia que não fosse embora; foi preciso entrar com você e pedir à professora que me deixasse ficar ao seu lado, na sala, nesse primeiro dia, para ir tomando confiança; depois de se sentir bem seguro, chegou até a me dispensar: a maioria das vezes não só não me pedia mais que eu não fosse embora, como se esquecia de se despedir de mim ao sair correndo do carro para se encontrar com os novos amiguinhos.
... Não se meta na minha vida?
Do colégio, recebíamos freqüentes observações: não liga para nada, é indisciplinado, briga com os outros, não quer fazer seus deveres, passa o tempo no banheiro, rabiscou a caderneta do coleguinha, machucou o pé, quebrou a mão... além disso é pago o colégio em que você estuda.
Você foi crescendo, como também as suas aventuras, a tal ponto que um dia tive de suplicar ao diretor para que não o expulsasse.
... Não se meta na minha vida?
Mal a vizinha me via chegar, já vinha me dizer: "seu filho quebrou uma vidraça da minha casa, rabiscou a parede, anda brigando com o meu filho etc".
Você continuou a crescer, mas queria fazê-lo apressadamente, urgia conhecer todos os lugares de diversão da cidade, você só tinha 13 anos e queria ir a todas as festas de seus amigos que completavam 15, não queria mais que o levássemos aos seus encontros, pedia que o deixássemos uma rua antes e voltássemos para pegá-lo uma rua depois, porque você é "cool", não queria saber de chegar cedo em casa, ficava chateado se lhe dávamos regras a seguir, não podíamos fazer comentários acerca de seus amigos sem se voltar contra nós, como se você os conhecesse a vida inteira e nós não passássemos de uns perfeitos desconhecidos para você; me empresta o carro, ia dizendo, e eu me sentia o pior pai do mundo por não fazê-lo...
... Não se meta na minha vida?
Constantemente sua mãe precisa arrumar as mesmas coisas do seu quarto, incluindo as que você larga pelo assoalho, ela arruma num dia e no outro tem que fazer tudo de novo, pois estão sempre espalhadas.
... Não se meta na minha vida?
Já se passaram meses e suas notas escolares não chegam, sua mãe e eu não queremos criar mais problemas, perguntando; chamaram-nos da escola e precisamos ir falar com a professora, sabemos que você foi reprovado, e se não se apressar perderá todo o curso...
... Não se meta na minha vida?
Cada vez fico sabendo menos sobre você, por você mesmo, e mais pelo que ouço de outras pessoas. Já nem gosta de conversar comigo, diz que vivo repreendendo você, qualquer coisa que eu faça lhe soa mal, ou se torna motivo para zombar de mim, pergunto: com todos estes defeitos eu teria podido lhe dar o que você tem tido até o momento? Serei mesmo esse ser humano tolo e torpe? Sua mãe passa noites em claro e por sinal não me deixa dormir, dizendo que já é de madrugada e você ainda não chegou. Você só me procura quando é preciso pagar alguma coisa, ou precisa de dinheiro para ir à escola ou para sair, pior ainda, diz que eu só o procuro para lhe chamar a atenção...
... Não se meta na minha vida?
Hoje me telefonaram, dizendo que será celebrada uma missa em ação de graças por todos vocês que concluíram a Faculdade; você mesmo me avisou, mostrando desinteresse, como se não lhe importasse que eu fosse participar da cerimônia, e no entanto esta foi para mim uma grande notícia que me fez sentir muito feliz. Como eu poderia perder esta celebração, disse-me a mim mesmo, e aqui estou eu.
... Não se meta na minha vida?
Sem dúvida, a esta frase repetida e à minha reflexão, cada um de vocês, que é pai, pode acrescentar suas importantes opiniões, pode corrigir, aumentar e até modificar o sentido, mas não quero nem imaginar que vocês, sendo pais, tivessem decidido a não se intrometerem na vida de seus filhos, pois o que teria ocorrido então?
Com toda certeza, alguns de seus filhos não estariam aqui. Se vocês tivessem se intrometido a princípio e logo depois desistido desse dever de alimentar, educar, cuidar etc.. muitos deles não teriam conseguido alcançar nenhuma meta, apesar do esforço inicial de vocês. Se os pais não se preocupassem com o que os filhos fazem, aonde vão, e com quem saem, talvez muitos deles não estariam mais entre nós, ou quem sabe estariam em um hospital ou aprisionados em algum vício.
Estou certo, porém, que diante destas palavras: "Não se meta na minha vida..." podemos responder juntos:
“Filho, eu não me meto em sua vida, você é que se meteu na minha, e posso lhe assegurar que desde o primeiro dia até hoje eu me sinto o homem mais feliz de todos”.
Pais, graças a Deus por terem se metido na vida de seus filhos, porque graças a isso agora podemos vê-los realizados em mais uma etapa de sua formação.
Somente os pais que sabem se meter na vida de seus filhos conseguem fazer deles homens e mulheres de bem.
Muito obrigado, papais!
Aos filhos, tenho a dizer que valorizem seus pais, se eles não são perfeitos, vocês muito menos o são, ou então aguardem mais um pouco até conhecerem os críticos mais implacáveis desta vida: seus próprios filhos.
Fonte: Catholic.net / Família.cl
Tradução: M. C. Ferreira - 28.01.09
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